Teias de Aranha

quinta-feira, fevereiro 16, 2006

O Sahara em meu redor

Hoje alguém me disse que, por vezes, é preciso atravessar o deserto para alcançar um presente maior e que quando isso acontece damos mais valor. Eu quero acreditar que seja verdade, mas ao mesmo tempo questiono-me sobre quantos desertos terei ainda que percorrer nesta vida até encontrar o meu oásis. Não é a primeira vez que me encontro no fio da navalha, isso já aconteceu no passado e sempre por vontade e escolha própria. Fui muitas vezes acusada de ser destravada, sonhadora e alérgica a compromissos, uma cigarra. Por isso, não deixa de ser irónico que, na primeira vez em que realmente queria ficar num lugar, me tenham obrigado a partir.
Não era o meu sonho de consumo e muito menos o lugar ideal. Na verdade era uma espécie de campo de trabalhos forçados para gente com curso superior, uma prisão... Mas era também o meu passaporte para uma vida mais estável, algo que nunca tive desde que fui viver sozinha. Sendo assim, pergunto-me: será o nomadismo o meu destino? E porque me assusta tanto a ideia?
Hoje parecem-me distantes aqueles tempos em que pouco me afectava. O Bob Seger tem uma música, "Like a Rock", que fala precisamente da invencibilidade da juventude, quando temos o Mundo aos pés. Nada é impossível, nada está longe demais. Nessa altura os golpes atingiam, magoavam, mas parece que as feridas saravam com uma rapidez maior. Julgávamos implacavelmente os mais velhos, confundindo bondade com fraqueza, honestidade com falta de inteligência e adversidade com derrota. E tínhamos a certeza de que conseguiríamos fazer muito melhor. Não era maldade, apenas ingenuidade e uma alteração de consciência que nos protegia da crueza da realidade.
Em que ponto é que essa alteração de consciência começa a perder o seu efeito alucinogéneo é difícil dizer. Quando me apercebi já era tarde demais e pude ver com clareza todas as forças capazes de me derrubar, a começar pelas da minha própria mente - é como sobrevoar uma cidade toda iluminada durante a noite e vê-la depois à luz do dia, salpicada de imperfeições. Parece que as tais feridas sararam, mas deixaram marcas daquelas que avisam quando o tempo vai mudar. Ou então é a minha carapaça que começa a acusar a falta de quitina e a amolecer porque neste momento há medos que começam a rondar, medo da solidão, medo de perder os meus sonhos (ainda não aconteceu por isso o estado ainda não é terminal), de envelhecer, de não conseguir sair do Barreiro tão depressa, de não ter dinheiro para internet ou para o ginásio, enfim, medo, medo, medo...
Por enquanto, o tempo à minha volta tem estado incerto, ora de calmaria ora levantando-se tempestades que varrem tudo à sua passagem. Mas continuo a travessia, "pego na mãe de Deus e vou".