Tudo que eu quero

Ser jornalista tem as suas vantagens... Viajar à conta, ficar hospedada em hotéis de cinco ***** sem pagar um tuste. Mas há sempre o reverso da medalha, a consciência cada vez mais nítida de que me estou a borrifar para alguns eventos. Não para os eventos propriamente ditos, mas para a atitude da maior parte das pessoas presentes. Desagrada-me profundamente este mundo de fachada, onde me parece que ninguém gosta de ninguém. As pessoas tornaram-se naquilo que vestem e na profissão que têm. O que cada um é, enquanto ser humano, há muito que deixou de importar... Parece cliché, mas é brutal quando se convive com este fenómeno frequentemente. Quero para mim a antítese disto tudo. Quero abrir um restaurante numa vila à beira-mar e ficar lá o ano inteiro, mesmo que só tenha clientes durante o Verão. Quero calma e paz de espírito. Santo André. As dunas. Voleibol. A pele a cheirar a óleo de côco. Sair da praia directamente para o barzinho de madeira que segue o sol. Imperial e petiscos. Amigos. Abrir as gavetas das memórias. Apanhar uma grande touca. Dizer disparates. Fazer disparates. Risota. Noites em que nada mexe. Noites quentes. Santo André. Beber sangria na praia. Tudo a jogar às cartas à porta de casa. O (meu) Alentejo. Regressar à infância e brincar às escondidas. Gritar golooooo. As cigarras a berrarem toda noite. Os grilos a berrarem toda a noite. Morcegos bebés que eu acho fofos, mas a minha prima Filipa odeia. As minha tias. A coruja na casa abandonada. Veneza. Alguém que me ame. Uma lareira no Inverno. Camisolas de gola alta e o vento a bater na cara. Cheiro a maresia. Café e fatias de ovo. Brincar na chuva. Os gritos das gaivotas. Ficar enrolada no edredon a ouvir o barulho da chuva e das ondas a baterem nas rochas. Banhos quentes. Dar mimos. Recebê-los. Música. Luvas quentinhas. Amigos. Crianças. Bichos. Bochechas rosadas do frio. Pele. Amor.